Arquivo mensal: Março 2015

Opiniões#5

Antes de ingressar na vida académica, acreditava que, para o exercício da profissão de jornalista, era necessária uma formação superior em Jornalismo/Comunicação, baseada em alguma teoria, mas mais ligada a uma vertente prática, que seria aplicada num estágio final promovido pela respetiva Universidade, de modo a que os alunos pudessem ingressar no mercado de trabalho com alguma experiência. No entanto, na minha opinião, há demasiadas cadeiras teóricas que no mercado de trabalho não contribuirão para um bom desempenho, pois se a teoria nos dá alguns fundamentos sobre o que é construir uma notícia (entrevista e/ou reportagem), na prática vemos que estes conceitos ficam muito aquém do exigido no mundo real do jornalismo.

Neste sentido, creio que a formação académica deve contribuir para uma formação mais virada para a prática, promovendo uma ligação entre as novas tecnologias de informação e o jornalismo, que tem que acompanhar a evolução dessas mesmas tecnologias, para que não se torne antiquado e desatualizado. Os diferentes cursos que existem na academia relativos à área da comunicação não estão ligados às novas tecnologias e, por isso, não preparam devidamente os seus alunos, também nessa vertente. A meu ver, a formação académica apenas poderia preparar melhor os seus alunos no que diz respeito ao uso das novas tecnologias no jornalismo. Quando terminassem a licenciatura, aqui sim, a academia poderia ajudar os seus alunos a ingressar no mercado de trabalho, não os abandonando e guiando-os na plataforma que estes escolhessem para trabalhar (imprensa, rádio, televisão ou online). Esta situação também não se verifica, já que quando concluímos uma unidade curricular, fica para trás não só a matéria, como também o contacto com o professor.

Posto isto, só posso afirmar que defendo uma formação técnica, em que é necessário haver uma parte reflexiva, mas, mais importante, um estudo e prática da técnica profissional, algo que transporte para a consciência dos alunos o que é ser jornalista, as vantagens e as desvantagens, ou seja, ensinar como é ser jornalista, não deixando esse trabalho exclusivamente para o estágio e consequente entrada no mercado de trabalho.

Em suma, durante o período letivo, sinto não existir ligação alguma entre a (nossa) academia e a profissão, pois não tive a oportunidade, através da academia ou por incentivo de professores, de visitar  nenhuma redação,  estúdio televisivo ou radiofónico que, na minha opinião, podiam clarificar a mente de muitos estudantes relativamente à vertente em que mais gostariam de trabalhar quando exercessem a profissão. Na fase de estágio, não falando por experiência própria, porque ainda não fiz qualquer tipo de estágio – curricular ou profissional -, acho que a academia deveria ter mais ligação entre o estudante e a entidade promotora, visto estar a aproximar-se a entrada do aluno no mercado de trabalho e ser necessário continuar a fazer o seu trabalho, formar profissionais em Jornalismo e Comunicação.

Ana Caiola | UNovaLisboa

Experiências#2

A etapa final da formação em Jornalismo na UMinho faz-se em Projeto de Jornalismo. É uma unidade curricular em que os estudantes desenvolvem um projeto de investigação jornalística numa lógica multimédia, articulando formatos, géneros e conhecimentos adquiridos não só na área do jornalismo, mas também em outras disciplinas da Licenciatura. Estes trabalhos são publicados em formato digital e, no último ano, tem-se procurado orientá-los na direção do jornalismo de dados (tanto quanto é possível fazê-lo). Em grupos de dois, os alunos podem escolher o tema que querem tratar, que tem de ser relevante, atual (ou, por algum motivo, ter ganho atualidade) e suportado pela leitura dos dados. Tudo isto sem esquecer “o apego a uma boa história”.

Este Projeto de Jornalismo tem sido também um espaço de aprendizagem para os professores, que a cada ano vão aprendendo como ensinar jornalismo para o “ambiente digital”. Por isso mesmo se refere no blogue onde estão publicados os trabalhos que esse é, acima de tudo, “um lugar de repouso sereno para o fruto de muitas horas de trabalho”.

Luís António Santos e Sandra Marinho | UMinho

Opiniões#4

1) Que vantagens vê numa formação académica em Jornalismo/Comunicação para o exercício da profissão de jornalista?
Lembro-me da forte impressão que me causava, nos idos dos anos de 1990, por alturas das férias escolares nos EUA, a leitura do pequeno texto de abertura da revista Time: “To our readers”. Um deles, pelo menos, era dedicado aos estagiários que nesse ano tinham sido acolhidos na redacção. Em termos sempre calorosos, o responsável de serviço dava-nos a conhecer quem era e donde vinha cada um. Motivo da forte impressão que me provocava essa leitura: as origens académicas eram as mais diversas, estendendo-se das Humanidades às Ciências.
Uma das maiores vantagens da formação académica em Jornalismo/Comunicação será a de que o candidato começou, mais cedo e de forma academicamente tutelada, a problematizar questões específicas da comunicação mediada e do exercício profissional. Mas também vejo com muito bons olhos a presença numa redacção de gente oriunda de outras disciplinas.
É verdade que o jornalismo integra, cada vez mais, contributos das pessoas antigamente conhecidas por audiências, e por isso essa diversidade disciplinar na formação académica dos seus praticantes será talvez, menos crucial. Mas confesso que a redacção ideal, para mim, continua a ser aquela que correspondesse à imagem que fazia da redacção da Time naquelas semanas de férias escolares: um cadinho onde se fundiam, ao serviço do jornalismo, todas as experiências e saberes – Direito, Matemáticas, Engenharias (nelas integradas hoje, claro, as informáticas, o multimédia, a computação gráfica), Economia, Gestão, Ciências Naturais, Medicina, História, Filosofia, Sociologia, Línguas e Literaturas e por aí adiante.
Sendo que este “por aí adiante” não é inimigo do exercício profissional por quem não tenha “canudo” para exibir. Não, o jornalismo não começou no ano em que saíram os primeiros licenciados da Nova. Licenciados de outros cursos foram passando, ao longo do século XX, pelas redacções portuguesas. Alguns bem ilustres. Como ilustres foram redactores, repórteres, articulistas que nem o liceu completo chegaram a fazer. Para não apontar exemplos cá de dentro: num texto já com mais de 20 anos, em que lamentava a emergência de uma nova cultura do trivial, da celebridade, da bisbilhotice e do sensacionalismo, orientada para as audiências, Carl Bernstein (o “outro”, do caso Watergate) contava que o jornal onde começou a trabalhar aos 16 anos tinha sido de algum modo a sua faculdade  — um local onde aprendera o sentido da perfeição e da procura “da mais fiel versão da verdade”, a noção dos ideais do interesse público e comunitário, da concorrência com princípios, do empenho no civismo e na decência. E que o bom jornalismo exige um considerável grau de coragem (“A minha geração, a vossa geração”, Público, 10.7.1994).

2) Que resposta deve a formação académica dar aos efeitos da associação do mercado e das novas tecnologias ao jornalismo?
Fica implícita nos parágrafos anteriores esta convicção de que (desculpe-me Terêncio o abuso), nada do que de interesse ocorre no mundo  pode ser estranho a uma redacção. Grave seria se a formação dos jornalistas descurasse as componentes tecnológicas, empresariais e organizacionais que estruturam e condicionam o campo.

3) Defende uma formação sobretudo técnica (estudo e prática da técnica profissional) ou alicerçada numa componente mais reflexiva (estudo do jornalismo integrado no universo mais vasto da comunicação)? Porquê?
Por tudo o que deixei dito, compreender-se-á que defenda mais do que isso. Defendo, simultaneamente, um alargamento das fronteiras dos saberes. Mas inverto a ordem: primeiro, os alicerces, a componente reflexiva; depois o estudo e prática das técnicas profissionais. Aproveito para sublinhar que incluo na expressão “componente mais reflexiva” as questões éticas e deontológicas da prática jornalística (hoje, mais do que nunca, distintivas do exercício profissional). Faço, de qualquer modo, um alerta que venho repetindo desde o II Congresso do Jornalistas (Deontologia, 1986): fazer jornalismo exige um apetrechamento cultural e profissional que permita entender os factos e os seus enjeux, encontrar a palavra exacta e usar os meios técnicos mais adequados para que o receptor entenda os significados. A ignorância, a mediocridade e a incompetência técnica constituem delitos contra a liberdade de expressão, contra o público e contra profissão.

4) Que ligação deve existir entre a academia (cursos de jornalismo) e a profissão, durante o período letivo e na fase de estágio?
A melhor e mais enriquecedora possível. Chamando à docência ou convidando para seminários ou conferências, profissionais no activo e antigos profissionais. Tomando iniciativas ou aproveitando realizações que propiciem a imersão dos alunos em ambiente jornalístico (visitas, debates, filmes, trabalhos práticos). Daquelas que conheço directamente ou de que vou recebendo notícia, tenho muita expectativa em ver, dentro de dois ou três anos, os resultados das experiências em curso em mestrados e pós-graduações na FCSH/UNL, no ISCTE e na UAL. No que respeita aos estágios, as más experiências chegam para que se imponha uma revisão séria do sistema, num diálogo entre a escola, as empresas, e a profissão.

Adelino Gomes | Jornalista | CIES IULisboa

Trabalhos#2

No laboratório em que habitualmente transformo as minhas aulas, analisamos conteúdos jornalísticos promotores de debate e impulsionadores da articulação entre a dimensão concetual e a operativa, assumindo o resultado da ação jornalística quotidiana o espelho dessa articulação. Neste sentido, trabalhamos, essencialmente, a reportagem, o género que, na sua essência, promove essa síntese. O jornalismo de investigação, produto supremo da articulação entre método e ação, ou entre a dimensão reflexiva, propiciada pela dinâmica académica, e o exercício profissional quotidiano, é o molde que seleciona os conteúdos que seleciono. Aos trabalhos de jornalistas portugueses e estrangeiros, associo alguns exemplares do meu portefólio pessoal.

São trabalhos de persistência, de confronto permanente de fontes, onde a relação jornalista – fontes suscita os mais diversos debates. Representam, no fundo, a síntese de dois mundos – academia e profissão – que me esforço por entrecruzar, num exercício de valorização permanente da identidade que molda cada um deles.

A GR Profissão Ex- ministro (2012) investiga meia centena de governantes que fizeram do poder uma porta giratória com o mundo dos negócios, expondo a complexa mistura de papéis e o que essa mistura suscita.

Pedro Coelho | UNovaLisboa | SIC